Diálogos Ibéricos em Cabrela
Cante alentejano, fado e flamenco numa seara alentejana
Cabrela 26 de agosto de 2023
Num final de tarde de agosto, numa deslumbrante seara da vila alentejana de Cabrela, com o pôr do Sol por horizonte, vai acontecer um concerto mágico e único que junta em palco as três principais tradições musicais da península Ibérica: cante alentejano, fado e flamenco.
Este é o primeiro evento do Alentejo World Heritage Festival, a organizar anualmente pela Égide e pela associação Lar Doce Ler.
Da autoria do compositor e pianista Filipe Raposo, com direção musical de Paulo Vassalo Lourenço, o Sefarad Project revisita a música sefardita, trazendo para o presente uma seleção de canções dos antigos judeus de Portugal e Espanha.
Criado na sequência de uma encomenda da Égide, estreou no festival Cistermúsica, no Mosteiro de Alco- baça, em julho de 2022. Em outubro do mesmo ano, foi apresentado no Algarve Music Series, chegando agora à vila de Cabrela.
A música sefardita foi transmitida durante séculos através da tradição oral e não há exemplos de música escrita até ao século XIX. No entanto, pode ser provado com bastante rigor que algumas destas canções foram compostas antes do decreto de expulsão de 1492, quando os reis católicos, D. Isabel e D. Fernando, romperam com uma longa tradição de tolerância religiosa em Castela, Leão e Portugal. O édito foi publicado a 31 de março: os judeus de Castela e de Aragão eram obrigados a converter-se ao cristianismo, sob pena de serem expulsos de Espanha.
O ladino sofreu mudanças linguísticas após a expulsão dos judeus da Península Ibérica, incluindo a adição de uma quantidade considerável de voca- bulário grego e turco, mudanças gramaticais e, na América Latina, uma alteração para uma versão mais latino-americana do espanhol. Quanto mais perto do castelhano medieval, mais antiga é a canção.
A música medieval judaica e árabe estão intimamente ligadas. A música sefardita desenvolveu-se no mundo árabe durante o auge do domínio muçulmano no Al-Andalus, em Córdoba, epicentro da música árabe. As escolas de música de Córdoba educaram não apenas. músicos árabes, mas também músicos judeus e europeus.
A música judaica faz uso dos modos árabes, recorren- do com frequência às formas estruturais das canções árabes. Esta ligação é de grande importância para o intérprete, pois embora não existam tratados sobre a interpretação desta música, existem tratados de música árabe, contemporâneos ao auge da música ladina, onde se explica o uso de uma ornamentação extensa e pessoal, frequentemente de natureza improvisada, de acordo com o makam [um padrão melódico da música clássica otomana] em uso.
Relativamente à sua análise modal, existem modos intimamente relacionados ao makamat árabe (sistema de modos melódicos usado na música tradicional árabe) e que eram usados regularmente pelos judeus da Espanha medieval. Em termos árabes, os makamat judaicos mais comuns eram Nahawand (semelhante à escala menor natural ou menor harmónica) e Hijaz (um modo fortemente associado à música árabe e judaica, estruturado como um menor harmónico que começa no 5. grau da escala).
A análise modal pode ajudar a confirmar a proveniência das canções.
1 Durme querido hijico
trad. sefardita/Filipe Raposo
2 Hija mia mi querida / Tirioni
trad. Sefardita/Portuguesa/Filipe Raposo
3 Dicho me habían dicho
trad. sefardita/Filipe Raposo
4 Abenamar/Ibn Ammar
trad. sefardita/Filipe Raposo
5 Los guisados de las berenjenas
trad. sefardita/Filipe Raposo
6 Bre Sarika
trad. sefardita/Filipe Raposo
7 Los caminos de Sirkedji
trad. sefardita/Filipe Raposo
8 Durme mi alma donzela/En tu puerta
trad. Sefardita/Portuguesa/Filipe Raposo
9 Puncha, puncha
trad. sefardita/Filipe Raposo
10 Skalerica de oro
trad. sefardita/Filipe Raposo
11 En tierras ajenas / Alentejo, Alentejo
trad. Sefardita/Portuguesa/Filipe Raposo