Ópera?! Mas isso é uma seca!”
Assim respondi a um convite para figuração numa produção de ópera do então Festival de Ópera de Óbidos. Estávamos em 2005 e eu, com 15 anos e no auge da adolescência, pensava noutras coisas…
Certo era que o palco já me era parente desde os três anos. Mas aquele convite não me fez sentido e, por isso, recusei-o. Uma recusa que seria apenas até ao ano seguinte. Numa manhã de agosto de 2006, recebi um telefonema dizendo que na tarde daquele mesmo dia deveria estar na cerca do castelo para um ensaio de Madama Butterfly, onde faria figuração. Impossibilitada de recusar, assim fui. Quando dei por mim, estava no palco, vestida com um kimono colorido, flores no cabelo e a cara pintada de branco. Fez-se aquele ensaio e mais outro, e uma récita. Fui conhecendo todas as pessoas envolvidas na produção e fui percebendo aquele mundo. Era um mundo novo para mim. A música, a caracterização, tudo o que acontece por detrás do palco, o público, os aplausos, era tudo novo. E sabia tudo tão bem.
No final do espectáculo, alguém da produção veio ter comigo e perguntou se eu não queria fazer parte do coro de Don Giovanni, que iria à cena uns dias depois. Sem saber bem o que estava a dizer, aceitei. Foi-me dada uma partitura do que seria necessário cantar e as indicações de quando seriam os ensaios e os espectáculos. Naquele momento nem olhei bem para a partitura, tal era o deslumbramento. Sabia apenas que tinha de a memorizar o mais rápido possível. Cheguei a casa e pus-me a estudar no meu pianinho. Rapidamente encontrei um problema – a edição trazia o texto em dois idiomas. E agora? Estudo o italiano ou o alemão? Nada disto era óbvio para mim, nem sequer alguma vez tinha pegado numa partitura de ópera. Eu tocava na banda filarmónica e cantava em coros amadores e em festivais da canção. Facilmente encontrei a solução: memorizei tudo! No dia do primeiro ensaio cheguei cheia de nervos. Nunca tinha cantado num coro assim! Lembro-me perfeitamente de estar no ensaio e o maestro dar a entrada; eu ia cantar, mas fiquei fascinada com o som que ouvia à minha volta. Bom, à segunda entrada já cantei e depois não parei mais. Ensaios, caracterização, ver os cantores solistas “em acção”…, tudo foi fascinante. Era como estar dentro de um filme.
No ano seguinte, fui convidada para pertencer ao coro do festival. Foi nesse ano que entrei no Conservatório Nacional. Um ano depois, em 2008, já fui convidada para fazer o meu primeiro papel de solista: o Pastor da entrada do 3° acto da Tosca. Que sonho!
A partir daí, não parei mais. Continuei os estudos no Conservatório Nacional, Escola Superior de Música de Lisboa, Centre de Perfeccionament Placido Domingo, estive nos maiores concursos mundiais, vários palcos, pianistas, orquestras, teatros… e sempre com o mesmo olhar brilhante igual ao daquela tarde em que entrei na cerca do castelo.
Costumam perguntar-me porque é que eu canto.
Eu digo que canto para ser feliz. E canto porque sou feliz!